quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Amados Capitães


Que me perdoem os fãs de Gabriela e sua pipa, de Tieta e suas aventuras no agreste, de Dona Flor e seus dois amores ou da morte de Quincas. Não li todos os livros de Jorge Amado e talvez nunca venha a ler. Mas digo aqui com orgulho que sou fã de Pedro, Dora, Gato e seus amigos. Li Capitães de Areia muito nova ainda, deveria ter uns 13 anos na época e ainda me lembro da cara da bibliotecária me dizendo carinhosamente que eu deveria voltar a olhar a sessão de Narizinho e seus amigos, não aceitei seu conselho e voltei pra casa com o livro nos braços.

A leitura era um pouco complicada para meu pouco vocabulário na época, mas a sensação de leitura me agradava tanto que eu não queria parar. Fui assim inserida no trapiche e nas ruas da Bahia onde esses garotos de rua, pequenos ladrões e homens de alma já viviam suas aventuras. Imaginei-me na Bahia pelos olhos dele, onde tudo era diversão, onde o areal era lindo e as negrinhas eram bonitas. Onde a água do mar era linda e o céu era um convite a ficar amando aquelas terras.

Depois desse livro nunca mais um carrossel foi o mesmo pra mim, assim como toda vez que vejo algo de cangaceiro lembro de Volta Seca, assim como a reza de Pirulito pra mim vai ser sempre a mais bonita e honesta, e assim Gato e Professor me ensinaram ginga e paixão pelos livros. E acima de tudo Pedro Bala me ensinou a ser um chefe decente e correto, embora eu nunca chegue a ter um grupo de ladrões já homens para comandar. Aprendi a amar e ser uma boa mãe com Dora, e assim também mantive em segredo minha vontade de cuidar de Sem-Pernas.

Anos depois, já no ensino médio minha turma da escola teve que fazer um trabalho com o tema de Jorge Amado, recordo-me de rapidamente indicar Capitães da Areia para a peça de teatro, ficando responsável pelo roteiro e ensaiar os atores. Aquela sensação de ser um Capitão de Areia, nem que seja por 15 minutos me dominou de felicidade e quando vesti minha roupa em frangalhos pude sentir-me estupidamente livre e feliz. A peça não foi das melhores, mas eu era livre naquele palco como aqueles garotos eram no livro, não havia um areal na minha frente ou o calor da Bahia, mas havia uma chama tão grande e acolhedora no meu coração que em fez amar esse livro desde o primeiro momento em que o li.

E no fim do livro, quando eu percebi que meus amados Capitães seguiam seus destinos, tristes ou felizes eu chorava de orgulho e dor. Dor por saber que a vida deles foi e era sofrida, e talvez continuasse até muito depois embora isso nunca chegasse a ser narrado no livro, mas havia o orgulho. O orgulho de ver que eles se tornaram homens melhores que muitas pessoas por ai nesse mundo e que eles serão um daqueles heróis que temos e poucas pessoas entendem. Talvez muito de vocês não compreendam o que pequenos ladrões podem fazer na vida de uma garota como eu, mas mesmo assim eu gostaria de agradecer a Jorge Amado por esse livro, sem ele eu não teria orgulho de dizer que tenho heróis brasileiros como referencia. Obrigada meu Jorge e com certeza Amado.

Segue abaixo Trecho do Livro “Capitães da Areia”
"No começo da noite caiu uma carga de água. Também as nuvens pretas logo depois desapareceram do céu e as estrelas brilhavam,brilhou também a lua cheia. Pela madrugada dos Capitães da Areia vieram. O Sem-Pernas botou o motor para trabalhar. E eles esqueceram que não eram iguais às demais crianças, esqueceram que não tinham lar, nem pai,nem mãe, que viviam de furto como homens, que eram temidos na cidade como ladrões. Esqueceram as palavras da velha de lorgnon. Esqueceram tudo e foram iguais a todas as crianças, cavalgando os ginetes do carrossel, girando com as luzes. As estrelas brilhavam,brilhava a lua cheia. Mas, mais que tudo, brilhavam na noite da Bahia as luzes azuis,verdes,amarelas,roxas,vermelhas, do Grande Carrossel Japonês."

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