segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Simples Desconhecido


Odeio a droga desse metro que me sacoleja de um lado para outro, não me permitindo ficar em pé direito ou ler alguma coisa. Resta-me apenas a opção de ouvir musica no aleatório sem nem poder pular alguma ou repetir, já que colocar as mãos no bolso é missão impossível!  Fico tendo esse tipo de pensamento aleatório até que a porta abre e mais umas dez pessoas entram, incluindo você.

Fico confusa por alguns segundos tentando lembra se te conheço de algum lugar, mas sabendo que no fundo já nasceu aquela vontade louca de fazer amizade com você. Mais um desconhecido na rua que tenho vontade de saber se ouve pop ou rock. Se ama Beatles ou Rolling Stones. Fico ali no metro olhando pra você por cima do tio de terno ou entre a cabeleireira da rua de baixo e o menino da padaria que me dá uma cantada quase todo dia.

Espero ansiosa todo dia a estação em que você entra e tento absorver os detalhes que vejo. Um dia de terno lindamente encantador e charmoso que me fez passar o dia todo no trabalho distraída. Outro dia de chinelo e camiseta regata, alternando poucas camisetas de banda e outras  camisas polo. Usando jeans skinner ou calça reta. Sapatênis e nunca tênis de mola. Fico ali na espreita observando e pensando pra onde você vai todas as manhãs e de onde vem no fim da tarde.

Perder o horário do metro é uma tortura pra mim. Fico de mal humor o dia todo e até meu namorado percebe isso. Coitado, eu penso. Não o traio em pensamentos, mas ele nunca entenderá que eu apenas quero saber quem é esse simples desconhecido que me chama tanto a atenção. Que me faz pensar em conspirações e sorrir ao ver outra pessoa com uma blusa que nem a dele. Meu namorado me manda sms de bom dia enquanto estou no metro indo pro trabalho e respondo sorridente até que um cheiro muito bom me desperta a curiosidade.

“Ei você, seu simples desconhecido. Não ande tão depressa, eu quero sentir seu cheiro mais de perto. Pra poder embalar mais uma porção de memórias bobas sobre você...”  Mas o metro é apertado e o máximo que consigo é ter uma muralha formada por cinco pessoas a nos separar. Suspiro alto percebendo que já perdi a essência do cheiro, o aroma que ficou no ar foi misturado a de outras pessoas. Se perdeu assim como perdi a estação que deveria descer e cheguei atrasada no trabalho.

Mudei a cor do cabelo. Mudei de emprego. Mantive o namorado. Fiquei noiva e quase não ando mais de metro. Dois anos sem lembrar do seu cheiro, sem pensar nessas memórias bobas...

Pego o metro vazio de noite, o ultimo em fato. Volto com uma bolsa na mão e na outra uma caixinha com os doces do casamento. Penso ainda se devo usar véu ou não até que alguém entra e reconheço o cheiro. Paraliso.

Percebo que era meu doce e simples desconhecido. Acompanhado de uma garota com olhos vermelhos. Ela chora e ele apenas nega com a cabeça. Ela não olha pra mim, mas ele sim. Há aquele segundo de reconhecimento onde mil memórias se passam pela minha cabeça e pelo brilho no seu olhar percebo que também passam mil recordações na sua cabeça. A garota desce, ele acena pra ela que não vê e depois que se senta fica me olhando assim que a porta se fecha. Há apenas nos dois ali, sentados um de cada lado do vagão nos olhando.

Você sorri e tive que sorri de volta, percebendo em como seu sorriso é lindo. Você se senta ao meu lado e vamos conversando sobre o tempo, sobre a garota que chorava, sobre a propaganda no telão do show que é mostrada naquele instante até que descemos na estação. Há borboletas na minha barriga nesse instante, batendo asas um pouco por ter compartilhado uma piada besta sobre política e um pouco sobre meu noivo que me espera na estação usando meus fones de ouvido amarelos. Ele se aproxima de mim, você estende a mão e diz pra ele cuidar de mim. Ele sorri sem graça e me abraça falando que vai tomar conta de mim direitinho. Ele comenta que estamos noivos e me faz mostrar a aliança na mão. Você havia reparado, mas diz que sou lerda e nem comento as coisas. Ambos riem. Percebo que estive apaixonada por você todos esses anos e nem sabia.

Era paixão, encantamento bobo mesmo sem nunca ter visto um sorriso seu de fato. E agora ali você sorrindo eu percebo que na minha volta está os dois grandes amores da minha vida e sem perceber sorrio fascinada. Você se despede de mim me dando um abraço longo e marcante. O primeiro e o ultimo. Sai andando sem olhar pra trás e eu fico ali parada ainda sentindo o calor do seu abraço.

Meu futuro marido fala que gostou de você. Não pergunta seu nome e eu agradeço por isso porque não saberia responder. Naquele noite, cinco segundos antes de dormir eu penso em você e agradeço por nunca ter tido coragem de ao menos perguntar seu nome. Você foi mais marcante assim, como um desconhecido.

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